sexta-feira, 8 de maio de 2009

Servidor público confessa crime na Praça do Índio

A editoria Cidades é caracterizada por noticiar fatos pontuais que, normalmente, encerram-se em um único dia. A repercussão de pautas, portanto, não ocorre com frequência. Um dos assuntos tratados com mais cuidado e que geraram matérias em seguidas edições dos jornais locais foi o caso do servidor do Banco Central José Cândido do Amaral. Ele confessou, em 28 de abril, ter matado dois moradores de rua na Praça do Índio.
Como instrumentos de análise da mídia impressa, foram escolhidos os dois jornais de maior circulação do Distrito Federal: Correio Braziliense e Jornal de Brasília. No dia que sucedeu à confissão de José Cândido, a capa de ambas as publicações foi igual. Dedicaram importante espaço, com chamada para a matéria no alto da página. As duas exibiram também a foto do criminoso em fundo preto. Frases de impacto e repúdio ao ato do assassino também foram usadas nos dois jornais.
O Correio Braziliense publicou matéria de mais de uma página contando como o relato de José Cândido ocorreu. Também foram divulgados trechos do depoimento que o criminoso prestou à Delegacia de Polícia. A edição do mesmo dia do Jornal de Brasília dedicou uma página inteira ao assunto. Ficou claro que os dois jornais trataram José Cândido como um criminoso que merece punição.
No dia seguinte, ambas as publicações repercutiram o caso. Dessa vez, a novidade da pauta foi a possibilidade de José Cândido ter cometido outros crimes. O Correio Braziliense transferiu a reportagem do interior para a capa do caderno. A cronista da editoria, Conceição Freitas, também dedicou o espaço que tem para comentar a bárbarie. Enquanto isso, a matéria do Jornal Brasília foi reduzida por um enorme anúncio e ocupou somente metade da página.
O terceiro dia de repercussão do crime limitou-se ao Correio Braziliense. A reportagem voltou para as páginas policiais, no interior do caderno, e continuou suscitando suspeitas sobre outros possíveis crimes de José Cândido. Já o Jornal de Brasília não noticiou novidades sobre o assunto e cedeu espaço para outros incidentes que, por sua vez, encerraram-se no mesmo dia em que ocorreram.
A TV Globo cobriu bastante a notícia nos dias 28 e 29 de abril de 2009. No dia 29, a notícia saiu em todas as três edições: Bom Dia DF e DF TV – primeira e segunda edição. No dia 28 de abril, no DF TV 2, uma das principais reportagens do noticiário foi: “Preso o acusado de matar mendigos na Asa Sul”.
No dia 29 de abril no Bom dia DF: “Funcionário do BC confessar ter matado moradores de rua”. Ainda nesse dia, o DF TV 1 continuou com a reportagem: “Assassino de mendigos deve ficar mais tempo na cadeia”. Foi nesse noticiário que a TV Globo deu mais ênfase ao ocorrido, fazendo uma entrevista com a delegada da 1ª DP sobre o crime e as possíveis penas para o assassino.
E no fim do dia, no DF TV 2: “Assassino de mendigos é investigado por abuso de menor”. Na semana seguinte, de 4 a 8 de maio, a TV Globo não publicou qualquer notícia sobre o ocorrido.

Homofobia
A abordagem sobre a aversão do servidor público José Cândido do Amaral a homossexuais foi tratada de forma secundária em rádios como a CBN. O fato de o crime ter sido motivado por, entre outros motivos alegados, homofobia deveria ter suscitado na imprensa uma discussão mais ampla sobre a discriminação contra LGBTs. No entanto, a maioria dos veículos limitou-se a apresentar o perfil sociopata do servidor e o quão perigoso ele é para a sociedade.
Levantamento do Grupo Gay da Bahia aponta que diariamente, pelo menos dois homossexuais são brutalmente assassinados no Brasil por conta de sua orientação sexual. O perfil dos assassinos não varia muito, sendo que boa parte deles pertencem à classe média brasileira. O assassinato dos dois moradores de rua pelo simples motivo de estarem trocando carícias foi um fato que poderia ser melhor explorado pela imprensa, iniciando discussões mais amplas sobre a discriminação de forma a despertar um senso crítico mais adequado nos leitores/ouvintes/telespectadores.

Cláudia Pinheiro, José Jance, Liana Rabêlo, Lucas Tolentino e Tamara Barreto

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